A vida do Servo de Deus
D. Manuel Mendes Santos

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Pais e nascimento

Manuel Mendes da Conceição Santos nasceu a 13 de Dezembro de 1876, em Pé de Cão, Freguesia de Olaia, Concelho de Torres Novas, numa casa hoje pertencente à família Godinho. Ali viveu os primeiros anos da sua infância.

Seu Pai — Manuel Mendes, casado em primeiras núpcias com Maria dos Reis, da qual teve uma filha de nome Maria, falecida em tenra idade — "era homem de abastada fortuna, que todavia perdeu por ter sido fiador de alguém e, tendo de pagar por ele, perdeu tudo, ficando reduzido a uma quase pobreza"[1].

Sua Mãe — Maria da Conceição Rodrigues Mendes — sofria por ver a derrocada material de sua família.

Tinham-lhe morrido cinco filhos pequeninos, e o seu coração temia pelo futuro dos dois filhos que Deus lhe conservara : Manuel e Joaquim.

Como mulher de fé, era na oração que se refugiava. E este "segredo" é-nos revelado em carta para seu filho Manuel, já Bispo de Portalegre, com data de 9 de Setembro de 1916 : "Dizes-me que no meio da tua tão espinhosa missão e de tanta responsabilidade, que vês mui claramente a protecção da nossa boa Mãe do Céu sobre ti: é verdade. Na capela de Pé de Cão, diante da sua imagem e banhada em lágrimas, muitas vezes pedi que tomasse os meus filhos à sua conta e cuidasse deles como coisa sua ; e na verdade, é-nos bem visível a sua protecção. Oxalá lhe saibamos ser gratos !"

Tendo vendido a casa de Pé de Cão, esta família esteve em Torres Novas e depois fixou-se nos Soudos.

Aos 9 anos, depois de aprendidas as primeiras letras, Manuel Mendes Santos foi para Carvalhal da Aroeira, a fim de estudar português e latim com seu tio-avô Padre Joaquim Gomes Duque. Foram assim as bases que dele fizeram um dos Prelados mais ilustres, sócio da Academia das Ciências e de quem Júlio Dantas escreveu: "Doutor pela Universidade romana de Santo Apolinário, latinista, helenista, espírito cultíssimo, escritor notável, o Senhor D. Manuel Mendes impôs-se sobretudo à admiração dos contemporâneos como orador, pelo prestígio, pelo trabalho e pela autoridade da sua palavra"[2].

Primeira Comunhão e Seminário

No dia 3 de junho de 1888, tinha então 11 anos, Manuel Mendes fez a 1a Comunhão. Desta graça, há-de recordar-se sempre. Nas suas "Agendas Pessoais", muitas vezes registou esta ou outras frases semelhantes:

"Missa — em honra de Nossa Senhora para que me faça fiel à graça da primeira comunhão" (3/6/1916) ; "Missa — em acção de graças pela minha primeira comunhão e pelos que nela me acompanharam e para ela me prepararam" (3/6/1924). E ainda, em 1938 : "Missa — em acção de graças pela minha primeira comunhão feita há cinquenta anos (3-6-88) e por todos os benefícios que dela derivaram".

Sentindo-se chamado por Deus à vida eclesiástica, entra no Seminário de Santarém em 1890, com 14 anos incompletos. Seu Pai, "não podendo ocorrer à sua educação, pela falta de meios", pede ao Cardeal Patriarca D. José Sebastião Neto "se digne admiti-lo gratuito no seu pequeno Seminário"[3].

Começa, assim, nova etapa na vida do futuro Arcebispo. Estudioso, aplicado, delicado para com os seus condiscípulos, respeitador dos seus superiores, "recorria-se a ele nas dificuldades do estudo, na elaboração dos programas festivos, na solução dos casos imprevistos"[4]. Monsenhor Francisco Maria Félix, que foi seu monitor, testemunha mesmo : "nunca julguei necessário adverti-lo de qualquer defeito"[5].

A vida no Seminário de Santarém não foi fácil para o jovem seminarista. Seus pais vivam com dificuldades e o seu amor filial sofria ao pensar nos sacrifícios que estes faziam para pagar os seus estudos.

A avaliar pelas cartas de D. Maria da Conceição Rodrigues Mendes, datadas de 1902 e que o filho religiosamente guardou, já nessa altura, de certo, a Mãe procuraria minorar-lhe este sofrimento, enviando-lhe, de quando em vez, pequenos mimos. "Escrevo-te hoje para dizer que vai amanhã, 2a feira, a roupa.(...) Mando dentro dum pão, uma chouriça, dois rins e um bocadinho de lombo." (2.3.902). Ou, noutra ocasião : " ... mando duas cestas de fruta: acabei agora mesmo de arranjá-las. É uma cesta de pêras e outra de pêras e damascos. Foi o melhor que pude arranjar." (6.6.902).

Por seu lado, Manuel Mendes procurava reduzir, ao máximo, as suas despesas, para não ultrapassar a "mesada" de que podia dispor. São de seu punho estes apontamentos, em caderno quadriculado e de cor já amarelecida : "Despesas do ano de 1891 — Setembro : dia 27, um selo — 25 réis ; 2 cadernos de papel, 40 réis ; Dezembro, dia 20, 2 folhetos de devoção, 40 réis. Dia 13 de junho de 1893 : álcool para nódoas, 40 réis." — E em 1 de Outubro de 1894 : "Vim para o Seminário e trouxe comigo 2.000 réis."

Curioso também, entre outros, o seguinte apontamento, com data de 14 de Dezembro de 1894 : "Recebi de prémio 12.000 réis." E, no dia 27 seguinte : "tirei do prémio para a viagem, 1.000 réis."

Partida para Roma

Assim se foram passando os anos.

A sua aplicação aos estudos, a sua piedade e as boas informações dos seus Professores, despertaram a atenção do então Cardeal Patriarca de Lisboa, D. José Sebastião Neto. Tendo o Santo Padre Leão XIII oferecido 3 bolsas de estudo para alunos portugueses, Manuel Mendes foi um dos escolhidos. E assim, a 20 de Outubro de 1895, com o entusiasmo próprio da sua idade, o jovem seminarista despede-se dos seus e parte de comboio para a Cidade Eterna.

No mesmo cadernito onde ia apontando as despesas, começou agora a anotar a lápis e com letra um tanto tremida devido ao movimento cadenciado do comboio, as suas impressões da viagem. Faltam 2 folhas neste caderno, mas a narração começa assim :

"Vale de Prazeres — a seguir uma paisagem encantadora — longas serranias amontoadas deixando ver os vales cobertos pela neblina. Passa-se um túnel (...) Penamacôr — a mesma paisagem — do lado de oriente, serranias que se encontram formando vales pitorescos que a neblina cobre semelhando um denso veu branco." Depois, Tortozendo... Covilhã, Belmonte, Sabugal, Guarda, Vila Fernando, Vilar Formoso e, finalmente, Fuentes de Onoro. E vai anotando as suas impressões : "— que lindas campinas, bonitos olivais. Ciudad Rodrigo, que me parece boa e um pouco antiga. É já noite". Em Fuentes de San Esteban, anota : "importante : gaitas que os rapazes tocam e que fingem o chorar das crianças. Chegou um comboio cheio de gente para mim inteiramente nova : homens esguios e de fatos justos, etc."

Mais adiante, toma de novo o lápis para escrever : "Roliça — tive ocasião de observar um tipo genuino de espanhol: camisa de linho fino presa ao pescoço por um broche de brilhantes, caindo em largas pregas dentro do peitilho. Este era de veludo azul com duas filas de botões de prata — jaqueta curta, redonda e sem gola com canhões abotoados com azinhas de vidro preto, de casulo e pé de prata; calça justa abotoada ao lado e botas de polimento com laço em cima; largo cinto de couro preto apertado também com fitas de seda preta."

Em Medina del Campo, admira a extensão do entroncamento e frisa, com surpresa : "passeiam frades e padres livremente." Igualmente em Bayonne : "linda cidade cortada por dois rios com muitas pontes; edifícios sumptuosos — catedral majestosa e bela — senhoras a rezar nas igrejas ; passeamos livremente: ninguém se admira de nos ver com batina" Para o jovem seminarista, tudo eram surpresas !

Em Lourdes

De 22 para 23 de Outubro, pernoita no Hotel de Henri IV, em Pau : "... chegámos às 10 h. e partimos às 6,25 h."

Aproximava-se, porém, o Santuário de Lourdes. A sua alma rejubila e as suas expressões parecem querer traduzir o que, de facto, não tem tradução: a alegria imensa de ir pisar a terra que Maria Imaculada visitara em 1854... : "espectáculo fascinador... sublime perspectiva — sensação extraordinária — os nossos corações apressam as pulsações e anhelamos pela ocasião solene de orarmos à Virgem nestes lugares que ela santificou com a sua presença."

Como é natural, a passagem por Lourdes marcou profundamente a alma de Manuel Mendes. Voltou ali muitas vezes — mesmo depois da mesma Senhora ter aparecido em Fátima — para recordar o ano distante em que, ajoelhado na gruta bendita, de certo se ofereceu à Mãe do Céu pedindo-lhe que abençoasse o seu futuro sacerdócio : "Se há no mundo lugares onde se possam comparar com o céu, é Lourdes um deles; ou antes, Lourdes é um vestíbulo e uma miniatura do céu."

"Disse adeus a Lourdes e a par da saudade levava na alma a esperança de que a Virgem me auxilie e escutará os meus rogos."[6]

Os seus apontamentos terminam aqui. Manuel Mendes segue de novo a viagem e, chegado a Roma, é recebido no Seminário Romano.

Para ele, mais do que a beleza dos monumentos, preocupavam-no "a dor e os males religiosos da Pátria e, diante desse lastimoso quadro, a organização do futuro. Esse jovem Manuel tomava já os caminhos de percursor do ressurgimento religioso, social, cultural, académico, que mais tarde, sob a sua poderosa e indefectível mão de chefe, havia de tomar entre nós formas tão belas, tão cheias de esperança e de encanto."[7]

O jovem seminarista Manuel Mendes da Conceição Santos chegou a Roma nos fins de Outubro de 1896. Ia completar os estudos no Ateneu de Santo Apolinário, segundo determinação do seu Prelado, o Cardeal D. José Sebastião Neto.

De índole piedosa e cumpridor dos seus deveres, dedicou-se, de alma e coração, a adquirir todos os conhecimentos possíveis, com um único fim: dar glória a Deus e ser útil à Igreja.

Nos seus apontamentos espirituais do dia 13 de Dezembro, escreve :

"Completo hoje vinte anos. Passou para mim uma parte importante da vida, quem sabe até, se a maior parte dela ? Que emprego tenho eu feito destes anos que Nosso Senhor me tem concedido ? Ah ! Eu devera -los empregado muito melhor do que tenho feito... Deus concedeu-mos para que eu O amasse e O servisse e eu, pelo contrário, tenho abusado do seu dom para ofendê-lo ! Perdão, ó meu Deus, portal ingratidão ! Ao menos que o novo ano de vida que para mim vou começar, seja todo dedicado ao vosso santo serviço ! Eu não sei o tempo que me resta de vida, mas seja ele qual fôr, eu quero, com o vosso auxílio, consagrá-lo todo a Vós !"

E conclui estas considerações com alguns propósitos : "Procurar convencer-me do nada que é o mundo e pensar frequentemente na morte ; obedecer prontamente aos meus Superiores e usar caridade com os companheiros ; evitar o dizer palavras em louvor próprio e atribuir a Deus todo o bem que em mim puder haver, pois que é verdadeiramente seu e não meu ; procurar crescer na devoção ao Sagrado Coração de Jesus, a Nossa Senhora e a S. José ; esforçar-me por conseguir um verdadeiro espírito de sacrifício."[8]

Manuel Mendes alicerçou assim a sua vida espiritual. Por isso não admira que, mais tarde, ao orientar as pessoas que a ele recorriam, sempre incutia a confiança e o desejo de perfeição.

A par destes apontamentos, outros manuscritos encontrados no seu espólio, nos dão luz sobre o seu dia a dia, isto é, as pessoas com quem conviveu ou com quem se corresponder, e até alguns pormenores sobre a doença que o levou a ter que ser internado num sanatório, em Nettuno.

Abramos, pois, o 1° Caderno. Tem a mesma data do texto já citado : "1896 — Dezembro — 13 — Hoje, dia dos meus anos, começo a escrever um diário, ou melhor, uma pequena relação dos acontecimentos que comigo se dão cada dia, entremeados com algum pensamento que as circunstâncias me sugerirem." E confessa com sinceridade : "Há muito tempo que pensava em fazer isto, mas nunca o cheguei a pôr em prática; vamos a ver se ao menos agora sou perseverante." E começa :

"Recebi ontem à noite carta de casa com correspondência de meu Pai, minha Mãe e meu Mano, enviando-me felicitações pelo meu aniversário."

Seria interessante transcrever, na íntegra, o seu "diário". Mas não sendo possível, respiguemos, aqui e acolá, alguns factos que possam ser mais significativos para dar uma ideia de como passou o tempo de aluno, em Roma.

13 de Dezembro de 1896 — perdido todo o tempo que se não emprega no serviço de Deus." E no dia 16 : "Fui chamado na aula de História Eclesiástica e, graças a Deus, parece-me que o professor ficou satisfeito." A 24, anota : "Foi hoje o primeiro dia de férias do Natal e para mim foi quase todo perdido, porque passado em passeio, na maior parte. Subi hoje, pela primeira vez, à cúpula de S. Pedro e estive na bola que a corôa. (...) É estupendo o panorama. De tarde assisti a parte de um pontifical arménio na igreja de S. Brás."

No dia de Natal vai até Ara Coeli : "... vi o presépio, verdadeiramente artístico, onde está o Santo Bambino. Achei muita graça às criancinhas que lá recitavam os seus sermõezinhos".

Problemas de saúde

Mas em fins de Dezembro, a sua saúde começa a ressentir-se do esforço feito nos estudos e, provavelmente, também do frio rigoroso do inverno romano. Não existiam aquecimentos, e Manuel Mendes não era de índole a pedir privilégios para si.

No dia 28, entre outras coisas, escreve : "Hoje levantei-me mais tarde por causada tosse." E no dia 1 de Janeiro de 1897 : "Recebi hoje uma caixa com cápsulas de óleo essencial de terebentina que amanhã começarei a tomar por causa de uma tosse um pouco forte que trago há dias." Depois, antes de terminar o resumo deste primeiro dia do ano de 1897, revela-nos os seus desejos : "Oxalá o ano que hoje começa seja todo passado no fiel cumprimento dos meus deveres, a fim de que, ao fim dele, se Deus permitir que eu lá chegue, eu não sinta o mínimo remorso por haver empregado mal o tempo que Deus me concede."[9]

Seja também esta a nossa aspiração !

Durante a sua estadia em Roma, como estudante, D. Manuel Mendes escreveu um "diário", do qual se conservam ainda três fascículos. É destes manuscritos, já citados, que continuamos a extrair alguns textos e informações.

No mês de janeiro de 1897, uma tosse persistente e forte levou o jovem seminarista à enfermaria, donde só raras vezes foi autorizado a sair para participar na Missa ou frequentar alguma aula. Como de costume, regista os tratamentos a que se sujeita : "emplastres com mostarda nas costas, bem como outros remédios." Mas dois dias depois, curiosamente anota : "Veio de novo o médico. Mandou-me continuar de cama e fez parar os emplastres, que já me tinham posto as costas a arder"...

Não sabemos — por falta de dados — pormenores sobre a evolução da doença. Sabemos, no entanto, que esta se agravou, visto que a 15 de Maio — início do seu manuscrito — Manuel Mendes já se encontrava no Sanatório Marítimo de Nettuno. O tratamento prescrito, porém, não o impedia de sair, visto que, a 17 do mesmo mês, escreve :

"Visitei a igreja do convento de S. Francisco, aqui de Nettuno, igreja e convento que foram fundados por S. Francisco em pessoa." — No dia 26, é-lhe permitido ir a Roma, a fim de assistir a uma canonização. A sua alma rejubila ! Os sentimentos afloram-lhe espontaneamente à pena : — 27 — Hoje assisti à canonização solene que se celebrou no Vaticano ; (...) ficámos junto à confissão de S. Pedro. Que magnificência a daquela cerimónia! Que número imponente de Bispos e Cardeais ! Como me comoveu aquela música, verdadeiramente celestial, do Cantate Domino, de Mustafá, cantada pela Sixtina juntamente com as 170 vozes argentinas dos sopranos, que estavam lá em cima, na cúpula ! A Igreja de Deus conta mais dois santos." E termina o seu comentário com este desabafo dolorido : "Quanta pena causa o ver que o Papa está prisioneiro, quando se assiste a tais festas !"

Devoção a Maria

No dia 28 volta para o Sanatório. Como não pode estar no Seminário no fim do mês, para ali manda "a súplica final do mês de Maria" e no dia 31 escreve : "Quem me dera estar hoje em Roma, com os meus companheiros, para a consagração do coração a Maria !... Que comovente cerimónia lá na capela ! " — De facto, nesse ano, não pôde estar. Mas no ano seguinte, o Senhor conceder-lhe-á essa graça, visto que escreve "diário": "Fizemos hoje coração a Maria, na capela dos filósofos. Foi uma função verdadeiramente tocante." A provar este facto, conserva-se em arquivo, a estampa que junto se reproduz, e no verso da qual se pode ler em letra de imprensa : "Dia 31 de Maio de 1898 eu, Manuel Mendes, entreguei o meu coração à Imaculada Mãe de Deus."

Efectivamente a devoção a Maria marca toda a sua vida. São de Dezembro de 1897 as seguintes preces e propósitos, escritos durante o retiro preparatório para o sub-diaconado : "Entrei em exercícios espirituais. Que a minha doce Mãe e Madrinha os abençoe e me faça um santo ministro do seu divino Filho". "O Maria, eu vos amo ; procurarei, com a vossa graça, propagar a vossa devoção e Vós, abençoai o meu apostolado." Ou ainda, ao meditar no Calvário : "Ó Maria, lembrai-vos do testamento de vosso Filho e comunicai-me aquela sede ardente que O devorava, sede de sofrimento, de humildade, de salvação das almas !... "

No princípio de julho, volta para Roma. Porém, pouco depois, escreve : "Tenho começado já há dias a achar-me pior. A tosse torna a apoquentar-me e começo a sentir um mal estar que começa a dar-me cuidados."

Entretanto, chegara o tempo de férias : "Preparamos os baús e as coisas que devemos levar para a quinta do Seminário, em Roccantica". E acrescenta : "Esperemos que os ares puros das montanhas me façam bem e me auxiliem o restabelecimento da minha saúde, tão inconstante !" Ilusão ! Dois dias depois, é chamado um médico "muito entendido quanto às moléstias de peito". Após atenta observação, diz-lhe que é preciso voltar a tomar ares de mar e ordena-lhe "muita cautela, leite, água de alcatrão e umas pílulas."

Manuel Mendes tem que se resignar a partir de novo para Nettuno. Escreve aos Pais, mas não lhes revela toda a verdade. "Pobre Mãe ! Se soubesse o que o médico me disse ainda há poucos dias ! — Deus queira curar-me dentro em breve, para evitar mais cuidados aos meus pobres Pais !"

Ao chegar ao Sanatório, regista : "Sinto-me exausto e também um pouco melancólico. Eis-me de novo nesta praia, longe dos meus companheiros e quem sabe por quanto tempo ? Nossa Senhora queira que seja por bem pouco e me melhore depressa."

Apesar destes momentos de "melancolia", Manuel pode dar passeios e fá-lo com muito gosto. No dia 11 de Agosto, por exemplo, escreve no seu cadernito : "Dei um passeio em barca, ao luar, com mais 12 ou 13 pessoas. Foi uma excursão verdadeiramente poética e alegre, que deixou todos contentes. Havia bons cantores na comitiva e no meio do majestoso silêncio da noite, sobre a superfície ondulada do mar, eram de um mágico efeito os harmoniosos cantos que se entoavam. Dava ideia de uma serenata ideal de um conto de fadas."

Por fim, deixa Nettuno em 28 de Outubro de 1897, e regressa ao seu querido Seminário.


[1] Cf. Amigo da Verdade, ANO XXIX, n.° 1462, 10-IV-1955

[2] Cf. Silva, D. Francisco Maria da, A Alma do Arcebispo Apóstolo, Ed. do Centro de Estudos « Dom Manuel Mendes da Conceição Santos » ; Braga, 1960, p. 171.

[3] Cf. Arquivo das Servas da Santa Igreja, Cx. 34, 4.

[4] Cf. Mons. FÉLIX, Francisco Maria, in Alvoradas, XVII (1956), Jan.° – Março, pp. 72-73.

[5] Ibidem.

[6] Cf. Livro de Despezas, pág. 49

[7] D. João de Lima Vidal, in "A Alma do Arcebispo Apóstolo, página 21

[8] Conf. Retiro – 1896 — Mês de dezembro — 13.

[9] Cf. Caderno Diário I , p. 6v.