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O SEMINARISTA MODELAR

Aprendidas as primeiras letras na sua terra natal, quando completou nove anos foi estudar Português e Latim com seu tio-avô, padre Joaquim Duque, humanista de grande saber, residente no Carvalhal da Aroeira, do mesmo concelho de Torres Novas, aonde veio finalmente habilitar-se, numa escola particular, para o exame de instrução primária.

Contava 14 anos de idade, quando foi admitido no Seminário Patriarcal de Santarém, em 2 de Agosto de 1890.

A bagagem literária que seu tio-avô lhe ensinara, aliava-se a uma inteligência aberta, a uma memória prodigiosa e a uma aplicação constante, que o fizeram cursar com distinção os estudos e Humanidades, Filosofia e o ano de Teologia. No primeiro ano de Seminário fez logo quase todos os exames dos três primeiros anos de Humanidades.

Sobressaía não menos o jovem seminarista pela compostura do seu porte, pela modéstia das suas atitudes e pela candura do seu olhar. Dele pôde testemunhar o reitor do Seminário Patriarcal de Santarém, mons. Francisco Maria Félix :

« Entre os cento e cinquenta alunos que o Seminário Patriarcal contava nessa época, Manuel Mendes da Conceição Santos era, sem dúvida, dos que mais atraíam sobre si, sem disso se aperceber, a atenção, o respeito e a simpatia dos companheiros. A sua inteligência, a sua paixão pelos livros, a sua piedade despretenciosa e comunicativa, a sua lhaneza, as suas conversas sempre úteis e edificantes, e a ausência completa de orgulho, impunham-no à admiração dos colegas e à estima dos superiores e mestres. Recorria-se a ele nas dificuldades dos programas festivos, na solução dos casos imprevistos. [...] Era um talento e uma bondade. Mais adiantado do que ele na idade e no curso, fui seu monitor, e, como tal, encarregado de acompanhá-lo e assistir-lhe de perto ; nunca, porém, julguei necessário adverti-lo de qualquer defeito. »

As suas excepcionais qualidades intelectuais e morais motivaram ser escolhido, em 1895, pelo Cardeal Patriarca D. José Sebastião Neto para ir frequentar o Pontifício Seminário Romano (o Seminário Maior de Roma) e o Ateneu Pontifício de Santo Apolinário. Ali foi condiscípulo de Eugênio Pacelli, futuro Papa Pio XII, e de muitos Cardeais e Bispos, com quem manteve sempre as melhores relações e que muito o admiravam, facilitando-lhe mais tarde o acesso aos diversos Dicastérios da Cúria Romana, quando ali ia tratar de assuntos respeitantes à Igreja em Portugal.

O seu comportamento exemplar no Seminário Romano levou os seus Superiores a escolhê-lo para prefeito substituto e, mais tarde, efectivo.

Em 1898 regressou da Cidade Eterna, doutorado em Teologia e diplomado em Letras Latinas pelo Instituto Leão XIII, apesar cio seu precário estado de saúde, que no último ano o forçou a passar a maior parte do tempo lectivo no Sanatório de Nettuno, à beira-mar, não deixando, porém, de salvar, mesmo assim, o ano escolar.

São desses anos recuados de 1896 e 1897 os seus primeiros apontamentos de retiros espirituais, em que se propõe : « não me gabar, nem procurar ser gabado, especialmente quanto a coisas espirituais » ; « fazer alguma mortificação, ao menos interna » ; «preparar-me atentamente para a Santa Comunhão e não deixar jamais uma recolhida acção de graças » ; « atender bem à meditação » ; « não murmurar » ; « suplicar instantemente ao Coração dulcíssimo de Jesus, a Sua Santíssima Mãe, ao meu especial protector Sr. São José e ao glorioso São Luís Gonzaga a graça da santa castidade, que é tão necessária, absolutamente necessária a todos, mas especialmente àqueles que se sentem chamados ao estado sacerdotal » ; « procurar compenetrar-me bem do meu nada e alcançar a santa e indispensável virtude da humildade » ; « procurar adornar agora a minha juventude, a minha alma com a doce beleza da graça, com a alegria e paz do Senhor e com uma santa generosidade » ; « procurar convencer-me do nada que é o mundo e pensar frequentes vezes na morte » ; « obedecer prontamente aos meus Superiores e usar, caridade com os meus companheiros » ; « evitar o dizer palavras em louvor próprio e atribuir a Deus todo o bem que em mim puder haver, pois que é verdadeiramente seu e não meu » ; « procurar crescer na devoção ao SS. Coração de Jesus, a N. Senhora e a S. José » ; « esforçar-me por conseguir um verdadeiro espírito de sacrifício ».